Análise do Glaspac
Com este post, o Planeta inaugura um novo cantinho para os aficionados: a análise – superficial, provavelmente – dos buggies brasileiros. Não é intenção chegar ao detalhe de estilo, que não temos formação para isso, mas apenas sob o olhar de alguém apaixonado por buggies.
E isto nos leva a outro ponto deste espaço. Precisamos que os proprietários de buggies mandem suas ideias sobre seus próprios buggies, o que gostam, o que não gostam, o que poderia ser (e, eventualmente foi) melhorado. Mas sempre focando nos detalhes originais do buggy, como ele foi projetado e fabricado.
Claro que este primeiro post só poderia ser feito com o Glaspac, que é o buggy que o Buggyman mais conhece.
…mas antes…
Um pouco da história do Glaspac
A Glaspac foi criada por Donald Pacey, em 1962, como uma das pioneiras na produção de artigos de fiberglass. Donald é um paulistano que viveu algum tempo na Inglaterra, onde conheceu de perto a utilização deste novo material.
Nos primeiros tempos, a Glaspac fabricou peças para ônibus e caminhões da Mercedes BenzA história da Glaspac nos buggies, ocorreu em 1968, quando um amigo de infância de Donald, Gerry Cunningham chegou da Inglaterra com a idéia de produzir buggies sobre plataforma de fusca, que já haviam aparecido por lá, depois de um grande sucesso na Califórnia, com a criação genial de Bruce Meyers.
No entanto, o Planeta acredita que a Glaspac não tenha fabricado buggies em série, mas apenas kits. A BRM nasceu exatamente para a montagem destes kits, posteriormente fazendo seus próprios modelos. A foto a seguir mostra um destes Glaspac montado pela BRM, como modelo M1.
Teria a Glaspac autorização para fazer um clone do Manx?
Existem algumas informações desencontradas sobre a licença que a Glaspac teria tido para copiar o Manx, aqui no Brasil. A Enciclopédia do Automóvel (Editora Abril) fala que houve esta autorização. Contudo, o Manx Club, em contato através de email, diz que Bruce Meyers não se lembra de ter dado tal autorização. Mas foi simpático em não dizer que era um clone não autorizado!
Uma matéria da revista AutoEsporte, em dezembro de 1969, mostrava o recente lançamento da Glaspac, seu primeiro modelo de buggy, que era ainda mais semelhante ao Manx e que foi modificado posteriormente, para o modelo que conhecemos. Foram modificados os paralamas traseiros para cobrir as rodas maiores e fizeram pequenas alterações no capô, como aquele vinco central.
Uma reportagem da 4Rodas fala que eles fizeram as formas a partir de um modelo em escala do Manx (veja a reportagem neste link) e que realmente não teriam obtido a autorização.
Outro Buggy Glaspac
Em 1972, antes de desistir de vez dos buggies e partir para a construção do AC Cobra e do Thunderbird, a Glaspac ainda tentou produzir o que ela chamou de Super Bug.
Uma reportagem da 4Rodas de 1972 mostrou este carro que era uma cópia fiel do Manx SR americano.
Dá uma olhada lá, depois de ler esta postagem aqui!
Quem foi a Tander Car?
Provavelmente em 1973 ou 1974, a Glaspac passou suas operações com buggies para a Tander Car e dedicou-se a outros projetos, como a réplica de um Cobra A/C, tida como uma das melhores do mundo e um Thunderbird, que não teve grande sucesso.
O primeiro folder mostrado a seguir foi enviado junto com um santoantônio comprado para o Velho’73 em meados da década de 70, enquanto o segundo foi encontrado na web e já mostra os nomes da nova empresa. Os demais marcam algumas publicidades de época, inclusive o Bugatti que eles fizeram com mecânica de Fusca.
A Plaqueta de Identificação do Glaspac
A plaqueta do Glaspac é um artigo raro nos buggies da marca, provavelmente porque eram montados em kits e os montadores não davam importância para ela. O Velho’73 nunca teve uma plaqueta. Em um passeio em São Paulo, ganhou uma plaqueta “virgem” de um dos buggistas de lá. Infelizmente, o velho Buggyman esqueceu quem foi!
A plaqueta a seguir é do buggy do Sonito, que está no site antigo desde 2004.
E, finalmente, a Análise do Glaspac
A carroceria
Vamos começar a análise do Glaspac pela carroceria. Por ser montado sobre a plataforma do Fusca, a carroceria precisa ser muito resistente, para não sofrer torções, formando quase um monobloco com a plataforma. O sistema funciona muito bem, pois é raro ver um Glaspac com problemas de trincas sérias na carroceria. Ela foi fabricada com muita qualidade e grande espessura.
O desenho, no geral, agrada pela simplicidade e pela praticidade de montagem.
O que é estranho é o local do estepe, que é moldado no banco traseiro, logo atrás do motorista. É de grande tamanho, capaz de abrigar grandes conjuntos de roda/pneu. No entanto, não prevê algum tipo de suporte e, se utilizado, perde-se, pelo menos, metade do banco traseiro. O Planeta não conhece nenhum Glaspac que utilize este espaço para estepe.
A caixa de bateria é bem localizada e de bom tamanho e, apesar da frente dela ser aberta, razoavelmente segura. Ainda existem alguns nichos sobre esta área, modulados para aumentar a resistência, mas que servem para colocar alguma ferramenta pequena.
Na galeria a seguir, o Glaspac vermelho do Geraldo Goss e o Velho’73, mostrando o local original do estepe, a caixa de bateria e também os espaços que devem ter sido projetados para colocar alguma ferramenta. Ou somente como reforço…
A imagem a seguir, mostra carrocerias do Manx II, com a exata configuração do Glaspac, inclusive as áreas reservadas para o estepe e para a bateria. O que o Glaspac tem a mais são algumas reentrâncias, que deveriam ser para ferramentas ou para reforço daquela área e a caixa da bateria parece ser bem maior, para comportar baterias de mais de 45A.
A Traseira
Na parte traseira do Glaspac, ocorreu uma abrasileirada, para aproveitar peças disponíveis por aqui. As sinaleiras foram herdadas da Variant, com um detalhe interessante, foram invertidas. A da direita foi para a esquerda do buggy e vice-versa. Além disso, foram montadas de “cabeça” para baixo. Interessante notar que o desenho casou perfeitamente com a carroceria.
A inclinação da carroceria parece ser muito próxima da inclinação que a Variant tem no local, de maneira invertida, então o refletor fica perfeitamente perpendicular em relação ao solo. Da mesma maneira, a parte interna acompanhou a saliência central da traseira. Provavelmente, todo o desenho da traseira foi feito pensando nestas sinaleiras, pois esta saliência não tinha no primeiro modelo, que usava sinaleiras do Fusca.
Na parte central da traseira, a solução do Glaspac para permitir acesso ao carburador e ao dínamo, foi utilizar o suporte de placa da Rural Willys, que tinha como característica principal, ser basculante e ter uma peça articulada que permitia mantê-lo levantado. Dizem que, na Rural, isso era para manter a placa visível quando carregava coisas maiores, com a tampa aberta. Enfim, a coisa é barulhenta, mas cumpre a função.
Acompanhava o kit do Glaspac, uma peça em fibra que servia para proteção da polia. O Planeta não tem conhecimento de algum Glaspac usando aquela peça, que não era nem um pouco prática.
Na foto a seguir, as sinaleiras de Variant aparentemente não estão invertidas, como deveria ser no original. E o suporte da placa de Rural. (foto de matéria da Revista Quatro Rodas).
A traseira do Glaspac fica praticamente em balanço livre e a solução foi colocar um suporte em forma de “T”, preso na torre da suspensão traseira e por três parafusos na lateral da carroceria. Neste mesmo ponto, era preso o parachoque original, o qual tinha mais um apoio nas laterais da placa. Sem este apoio, são comuns as trincas por ali. Outra opção de apoio do parachoque traseiro, era nos parafusos do garfo que sustenta o conjunto caixa/motor. Não é uma boa opção, pois aumenta o estresse do material naquela região.
Laterais do Glaspac
O Glaspac sempre teve laterais separadas da carroceria. O termo em inglês é “side pods”, Em português, o Planeta, na falta de um melhor, usa o termo “saias laterais”. O primeiro modelo tinha uma pequena indicação da marca em alto relevo, enquanto o tradicional, fabricado até 1971, tinha uma lateral ainda colada na carroceria, mas com grandes letras com o nome Glaspac, como o buggy apresentado abaixo, que pertence ao Milton e está na página do Facebook do grupo Brothers Buggy.
As saias laterais, fabricadas a partir de 1972 e que seguiram no Tander Buggy, sucessor do Glaspac, são feitas de fiberglass, mas sem o mesmo cuidado do restante do carro. Foram feitas muito finas, com um desenho que dificultava a fixação delas no carro, além de ficarem fazendo barulhos, pois movimentavam-se muito. Na análise do Glaspac, o Planeta considera as laterais mais recentes, como uma opção boa, em termos de estilo, mas muito ruim em termos de execução.
No Velho’73, depois de perder as saias algumas vezes na rua (!!!), elas foram coladas com fibra e resina na carroceria, fazendo um conjunto único, além de terem sido engrossadas por dentro.
As originais dá para ver na foto abaixo, da Revista Quatro Rodas, onde dá para ver, também, os piscas de Karman Ghia. As coladas do Velho’73, estão na foto logo a seguir.
A dianteira do Glaspac
O Glaspac, seguindo a regra de utilizar peças já existentes no mercado, usava os piscas do próprio Fusca, mas também do Karman Ghia ou do Jeep, na frente dos paralamas. Estas opções facilitavam a montagem, pois aproveitavam peças do carro doador ou outras, facilmente localizáveis no mercado.
Os faróis vieram de máquinas agrícolas. Estes faróis, com 130mm de diâmetro eram usados na maioria dos tratores fabricados na década de 70. São fabricados até hoje e aceitam o bloco ótico da Brasília, que já tem a luz de posição incluída.
Sobre o capô, em uma abertura circular, saia o bocal de abastecimento. Como a ideia era ser o mais simples possível, o tanque do Fusca era utilizado sem nenhuma alteração, motivo pelo qual a posição dele ficou meio estranha e saliente. A borracha de proteção foi herdada de algum veículo de época, o Planeta não sabe qual (Rural?). Ou poderia ser a borracha de passagem do tubo da direção na parede corta-fogo do Fusca.
Na imagem a seguir, uma publicidade da Glaspac com pisca do Fusca, farol de trator e o bocal de abastecimento. Os parachoques eram de fusca, embora a maioria deles usasse de tubos.
O Capô
O capô do Glaspac, fabricado em peça única, juntamente com o painel, não tinha abertura de portamalas. Ao centro, um vinco em “V” dava um diferencial ao visual. Juntamente com os paralamas retos, aumentava a diferença com o Manx original e dava um certo ar de “jipe” nele. Nos próprios paralamas eram fixados os faróis, em uma espécie de degrau, moldado na própria fibra. Nos Bugres antigos, havia um suporte de aço naquele ponto. A Glaspac teve uma solução melhor e mais durável.
Este capô, originalmente, era fixado com quatro parafusos na carroceria, na parte do painel, enquanto na área em contato com os paralamas, era com parafusos rosca soberba. Neste ponto, era colocado uma tira de acabamento do paralama do Fusca (debrum). Mas, mesmo assim, o atrito era inevitável e os ruídos sempre presentes. O capô, em peça única, era bem pesado e dificilmente ficava bem preso. Os proprietários que se virassem para encontrar uma maneira de fixar a coisa.
Olhando um Glaspac de frente, há uma certa harmonia nas linhas, embora o corte nos paralamas seja meio brusco e não corresponda às linhas arredondadas do resto do desenho. Mas é um visual agradável até os dias de hoje, com os faróis salientes como se estivesse de olhos arregalados! É um ar simpático, que arranca sorrisos por onde passa.
Este Glaspac amarelo a seguir, era do Julio Cesar e estava à venda em 2002. Com quem andará agora? Mais algumas fotos dele, aqui. Repare o vinco no centro do capô, o bocal de abastecimento bem saliente, os faróis de trator e os piscas de fusca sobre os paralamas. O parachoque é o estilo original, feito em tubos. O vermelho é do Geraldo Goss e mostra em detalhe, todos os componentes originais da dianteira, incluindo a lanterna do Jeep, o bocal de abastecimento e os faróis.
O Parabrisa
O arco do parabrisa do Glaspac, era feito a partir de um perfil de alumínio específico, exatamente igual ao utilizado pelo Manx. Ainda é possível encontrar esta moldura para ser montada em tamanho sob medida, no Mercado Livre. É só procurar por “moldura em alumínio para buggy”. Esta estrutura tem uma canaleta que permite a colocação de capotas sem precisar de fixadores ali na frente.
A inclinação do parabrisa era determinada por uma saliência no próprio capô, que definia o local e inclinação do parabrisa. Sobre o capô, também tinha um friso sob o parabrisa, que auxiliava a vedação, feita por uma borracha.
O parabrisa do Glaspac é praticamente um freio aerodinâmico, segurando muito o carro em rodovias, principalmente se tiver o motor 1.300 original da época.
Os limpadores de parabrisa vinham do carro doador, sem alteração alguma.
Este mesmo tipo de perfil é utilizado em vários buggies brasileiros e gringos, O Velho’73 ganhou um acessório feito para o Manx, que consiste em uma pequena peça de alumínio que se fixa nesta moldura do parabrisa para fixar um espelho.
O resultado é bem interessante, tanto visualmente, quanto funcionalmente, como da para ver nas fotos a seguir. Repara o Rocinante ali na frente…
O Painel
Como já foi dito, o painel do Glaspac é parte do capô. Isso facilitou muito a fabricação e até mesmo a montagem do buggy. Menos peças, menos barulho. O Manx II tinha um painel separado do capô e montado sobre uma estrutura de tubos. Parece que a solução da Glaspac ficou bem melhor neste quesito.
O painel foi desenhado para receber os mostradores originais do Fusca e vinha, no kit, com uma cobertura de fibra de vidro com acabamento imitando couro (???!!!). Não fazia muito sentido e o Planeta não conhece um Glaspac que mantenha esta peça desnecessária (não conhecia… logo abaixo, o painel do Geraldo). Também não existia portaluvas, embora haja espaço para isso.
Na foto abaixo, o Glaspac do Geraldo Goss e seu painel com a cobertura original.
A barra de direção é fixada diretamente no painel e podia ser com o próprio sistema do Fusca, que incluía a ignição e a tranca da coluna de direção.
Como pode ser visto, tudo feito dentro do mesmo princípio, de aproveitar o máximo de peças do carro doador e manter a simplicidade de montagem.
Santoantônio ou Santo Antônio
O kit do Glaspac incluía um santoantônio feito em tubo de aço e fixado por apenas um parafuso de cada lado, à plataforma do Fusca e um parafuso grande, que atravessava o tubo e era fixado direto na carroceria, pela lateral, em cada lado. A Glaspac oferecia este santoantônio em três versões: em aço pintado, revestido com courvin ou de aço inox.
Como se vê, quase nenhuma preocupação com segurança. Ele estava ali só para servir de apoio aos que ficavam no banco de trás ou para suportar a capota.
O Glaspac da foto abaixo pertencia ao Benê quando foi inserido na página antiga do Planeta. Belo exemplar, com o santoantônio original e as laterais antigas. Na época, os coletores de descarga utilizados eram os do Gurgel ou similares 4×2, com a saída elevada.
Finalizando a Análise do Glaspac
Não importa que seja um desenho copiado de outro buggy. Afinal, estes carrinhos foram tão copiados que levaram o próprio Bruce Meyers à falência.
Importa que trata-se de um design tão bem feito e simples, que até hoje é atual. É o estilo que o Planeta chama de “californiano”, pela expressão praiana pura e simples.
O Planeta acredita que um aficionado dificilmente manterá seu buggy tal qual foi montado originalmente. Sempre fará modificações, adaptações e melhorias que vão desde o visual até a motorização. É um carro que presta-se à experimentação. Daí a dificuldade de encontrar fotos com características originais.
E o Glaspac, com seu estilo praiano e despojado, também é o carro mais alegre que se vê circulando por aí.
E é por tudo isso que o Planeta considera o Glaspac o “Clássico dos Clássicos”, quando o assunto é buggy.
Colaboraram nesta matéria: Lucas Eduardo César, Geraldo Goss, Brothers Buggy.
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Ficou ótimo!!!!
Ótimo, muito bom!, Ansioso esperando a vez do Emis….rsrsrs! Abcao
O Emis vai ter sua vez! E, como sempre, vamos contar com o apoio dos “emistas”. Já vai tirando fotos de detalhes do teu.